O que pensam os especialistas em bioeconomia?

by Guilherme de Queiroz Stein [1]

Neste artigo, discuto alguns dos principais resultados encontrados no relatório Designing Sustainability Governance for the Bioeonomy – a Global Expert Survey (Dietz, Rubio, and Börner 2020). Fruto de uma pesquisa feita com 282 especialistas em bioeconomia do mundo todo, o relatório discute políticas e arranjos de governança que favoreçam transições para uma bioeconomia sustentável. Conceitualmente, está interessado em estudar como diferentes países vem adotando regras e políticas para impulsionar novas rotas de desenvolvimento. O pressuposto é que, além de políticas de suporte para que agentes privados possam obter sucesso econômico, é necessário estabelecer políticas regulatórias que lidem com consequências não desejadas do desenvolvimento bioeconômico, como o uso intensivo de recursos hidráulicos, mudanças nos usos do solo e aumento no desmatamento.

Em relação às políticas em vigor, à maior parte é direcionada para estruturar a oferta (supply side policies), com suporte à pesquisa e desenvolvimento, garantias à propriedade intelectual e alocação de incentivos econômicos. Com menor peso, também tem surgido políticas orientadas para fomentar a demanda, especialmente aquelas que objetivam elevar o nível de consciência social a respeito do consumo de produtos da bioeconomia. Outro ponto importante é que a bioeconomia não se desenvolve em um vácuo regulatório. Pelo contrário, 75% dos especialistas reportaram a existência de medidas regulatórias para lidar com consequências negativas, tais elevações excessivas no uso de água e mudanças no uso da terra. Também cresce de importância a percepção de que remover subsídios aos combustíveis fósseis e estabelecer impostos sobre emissão de carbono serão medidas cruciais para se avançar em transições sustentáveis.

Contudo, apesar de uma grande difusão mundo afora dos mais diversos arranjos de governanças, tanto políticas de fomento, quanto de regulação parecem sofrer de problemas de implementação. Para a maior parte dos especialistas, as políticas implementadas possuem efetividade média ou baixa, alertando para o fato de que pode haver um gap entre formulação e implementação. Provavelmente, o maior gap diz respeito a atingir objetivos de sustentabilidade, uma vez que há uma forte percepção de que o desenvolvimento da bioeconomia mundo a fora tem falhado em equilibrar objetivos sociais, econômicos e ambientais.

Para se avançar no desenvolvimento bioeconômico, entre as soluções apontadas pelos pesquisados estão a melhoria nas condições de financiamento, estebelcimento de parcerias público-privadas, promoção do acesso ao crédito às start-ups e envolvimento direto dos governos na comercialização de produtos. Ainda, melhorar a coordenação governamental, ampliar os espaços para diferentes partes interessadas participarem dos processos de formulação das políticas e estabelecer canais de comunicação são vistos como ações cruciais para se obter melhores políticas. No plano internacional, será crescente o peso de padrões regulatórios para o comércio exterior de setores ligados à bioeconomia, bem como o estabelecimento de metas de desenvolvimento compartilhadas entre os países, com exemplicado pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável adotados em 2015.

Também foi solicitado aos especialistas para avaliar o nível de sucesso em inovação bioeconômica de diferentes setores. Entre aqueles com maior sucesso em aplicar de forma inovadora princípios e processos biológicos estavam os de química industrial, geração de energia, indústria alimentícia e agricultura. Geração de conhecimento e tecnologia, estabelecimento de parcerias e colaboração e um contexto nacional favorável foram os principais fatores apontados como determinantes desse sucesso.

Por fim, cabe algumas reflexões sobre os caminhos da pesquisa sobre bioeconomia por parte de cientistas políticos. Há muito o que se conhecer sobre o que determina a adoção de instrumentos de fomento e regulação e também sobre a forma como diferentes contextos institucionais favorecem a participação e o protagonismo de diferentes atores, com interesses e percepções próprios da bieconomia. Do mesmo modo, é preciso olhar para a fase de implementação dessas políticas, buscando identificar as causas de sua baixa efetividade e entender os fatores que possam contribuir para alcançar seus objetivos. Ainda, chama a atenção que muitos especialistas consideram que um contexto nacional favorável é um dos fatores de maior importância para o sucesso econômico de inovações nessa área. Mas fica a pergunta, o que seria um “contexto nacional favorável” para a bioeconomia? Acredito que aqui temos uma porta de entrada importante para a Ciência Política, especialmente em compreender a forma como arranjos macro-institucionais, capacidades estatais, ideologias partidárias e cenários políticos instáveis afetam a formulação e a implementação de políticas para a bioeconomia, bem como as expectativas e decisões tomadas pelos agentes de mercado. Dietz, Thomas, Karla Rubio, and Jan Börner. 2020. Designing Sustainability Governance for the Bioeconomy – a Global Expert Survey. Berlin: International Advisory Council on Global Bioeconomy. https://gbs2020.net/wp-content/uploads/2020/11/GBS-2020_Expert-Survey_web.pdf (accessed 24.11.2020).


[1] Pesquisador doutoral no projeto “Transformation and Sustainability Governance in South American Bioeconomies”, na Universidade de Münster, Alemanha.